Educação inclusiva
Da Libras ao português
Novos materiais bilíngues prometem ampliar as possibilidades de comunicação entre pessoas surdas e ouvintes
Por Camila Ploennes
Novas palavras
Termos mais recentes usados em larga escala, como as redes sociais Twitter e Facebook, podem ter a origem do inglês, mas ganharam correspondentes em Libras e estão muito presentes no dia a dia da escola. Além de serem mencionados a todo instante por estudantes de qualquer etapa educacional, exemplificam as duas categorias de sinais em Libras: os sinais icônicos e os arbitrários.
Os icônicos são como o existente para Twitter, que remete a um passarinho, marca da rede social. Já os arbitrários não fazem qualquer alusão à palavra. Um exemplo é Facebook - duas mãos abertas (apenas o polegar encolhido) na vertical se movendo como se estivessem dando tchau uma para a outra.
Colega de Rafael na escola estadual, Francileide Alves Cordeiro tenta encontrar um caminho para que sua aluna do 9º ano, Thaís, de 17 anos, consiga compreender o significado das palavras em português.
- Ela é copista, copia as letras, mas não atina para o que quer dizer a palavra "lua", por exemplo, se não mostrarmos a imagem para ela - relata a docente à colega Celeste, que trabalha na sala de recursos multifuncionais da escola, onde é oferecido o atendimento educacional especializado.
Este é o primeiro ano de Francileide como professora interlocutora de Libras. Para ocupar o cargo é necessário concluir 120 horas de curso preparatório.
- Alcancei o nível considerado aceitável para lecionar para alunos surdos, mas estou me aprimorando.
Dificuldades
Ela estuda há um ano e meio para a função e leciona inglês e português na escola estadual há quatro anos. Sempre busca por palavras em Libras referentes a disciplinas de história e ciências, nas quais não tem formação específica. Thaís, sua aluna, teve outros interlocutores na escola anterior, mas contou à nova professora que não conseguia entender o que diziam. Na família, com três irmãos ouvintes, a pessoa que mais conversa com ela em Libras é a avó.
Com o passar dos dias de aula, Francileide notou que a menina conhece só o básico de Libras e confunde muitos sinais, o que ficou evidente quando a professora disse à estudante para "tentar" escrever.
- Ela me perguntou o significado do sinal para a palavra "tentar", e precisei explicar o conceito, procurando imagens na internet do celular para ela se dar conta do que era preciso fazer - lembra.
Em outra situação, Thaís usou o sinal de um palavrão quando queria dizer só a palavra "boba". Segundo Francileide, outra dificuldade é o número de faltas.
- Até março, a Thaís foi apenas durante uma semana completa e isso pode ter a ver com ela não se sentir estimulada, porque na outra escola ela conta que deitava a cabeça na mesa e dormia, nem copiar da lousa ela copiava - aponta a professora.
Um dos entraves para o surdo na escrita em português é compreender conjunções e preposições, classes de palavras que não existem na Libras.
- Quando passamos a interpretar Libras, dizemos "Gato rua" e não "O gato foi para a rua", mas a Thaís ainda não consegue escrever a frase completa em português sozinha, porque faltou esse preparo anterior - conta a professora Francileide.
Para escrever um pequeno conto hoje, pedido em exercícios do 9º ano, a estudante depende da professora para fazer a datilologia de cada palavra desejada, o que torna o trabalho um verdadeiro ditado soletrado.
Obras como o Manuário e o dicionário de ciências podem ajudar a travessia difícil de brasileiros como Pamela e Thaís, pegas no fogo cruzado de códigos de linguagem tão irmãos e tão distintos como a Libras e o português.
Fonte: http://revistalingua.com.br/textos/102/artigo309922-4.asp
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